sexta-feira, 30 de abril de 2010

Prece da Ausência.

Eu queria que tudo desaparecesse agora. Eu queria que o mundo cessasse de existir num piscar de olhos. Eu queria que tudo sumisse num sussurro. Eu queria que a cachoeira parasse de correr e que o céu escurecesse e eu queria esse vazio, esse silêncio, porque ele já habita dentro de mim. Eu queria a escuridão, eu queria a ausência do meu corpo pra que ele não sentisse a ausência do seu. Eu queria que tudo acabasse rápida e subitamente para não deixar nem suspeita nem lembrança de existência. Eu queria que tudo sumisse, eu queria o vazio.
Eu queria que não tivesse mundo, eu queria que nunca tivesse havido mundo. Eu queria a paz do eterno, da eterna ausência de tudo. Eu queria o nada: nada pra frente, nada pra trás, nada presente, nada ausente. Eu queria o nada infinitamente em todas as direções.

domingo, 25 de abril de 2010

Contam as estrelas que o arvoredo espesso sombreava um segredo. Esse segredo estava tão bem escondido que dele só sobraram as migalhas no canto da cotovia e no lamento das corujas.
Qualquer um que souber costurar as vozes dos pássaros o adivinhará mas os últimos que sabiam já desapareceram há muitos anos. Resta então adivinhá-lo em um olhar desprevenido de uma águia, que às vezes também olha perdida sem saber no que pensar.
Só assim - quando a águia olha fixo, porém sem mirar nenhuma presa - é possível vislumbrar a mensagem. No reflexo desse olhar está descrita a nossa invenção; que somos todos ficções da natureza.
Do lado de cá também podemos ver outras coisas mais. Podemos ver lampejos do eterno; porque as aves desse tipo sofrem mil mutações nos mergulhos mortais pelo ar a cada farfalhar de pena, mas seu olho permanece de um cristalino impassível.
Depois de dito tudo isso, uma vez mais contaram as estrelas e o total computado foi algo completamente diferente do início levantando a suspeita de que era o céu que escurecia algum segredo.
Da última vez que eu conferi o céu ainda estava suspenso e minha barba ainda crescia; mas quem nesse mundo vai acreditar em mim se eu sou só o sonho de uma borboleta?